ricardorosas rosas on Thu, 18 May 2006 22:23:22 +0200 (CEST)


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[nettime-br] Guerra Urbana - Mais dos Sistemas Paralelos


A "guerra urbana" em São Paulo traz novamente à tona questões aqui já
discutidas sobre os sistemas paralelos.

A questão da disseminação dos celulares e seus chips nas cadeias públicas é
um tema impressionante ao linkar movimentos paralelos com reivindicações
civis. Não se trata de julgar o "bem" ou o "mal" do caso, mas de constatar
como uma crescente "cultura do plug" ou das práticas de gambiarra está se
disseminando com o boom de tecnologias móveis.

A partir de agora vou postar uma série de textos em torno destas questões.

Muito interessante, por exemplo, é esta entrevista com o sociólogo Loïc
Wacquant que saiu na Folha de SP.

*GUERRA URBANA

Para Loïc Wacquant, que esteve no Brasil para analisar as desigualdades
sociais, é preciso agir no campo social, não só no criminal *

*"Acontecerá de novo", diz sociólogo francês *

*SÉRGIO DÁVILA*
DE WASHINGTON

Ataques como os do fim de semana devem ocorrer de novo e só podem ser
evitados se as elites políticas brasileiras e o governo do país
contra-atacarem no campo social, não no criminal. Polêmica, essa é a opinião
de um especialista no assunto: Loïc Wacquant, 46, professor de sociologia da
Universidade da Califórnia em Berkeley e pesquisador do Centro de Sociologia
Européia em Paris.
Francês, ganhador do prêmio da Fundação MacArthur, o "prêmio dos gênios",
ele estudou no Brasil as desigualdades sociais, o sistema carcerário e o
judicial, visitas que renderam livros como "As Prisões da Miséria" (Jorge
Zahar, 2001), "Punir os Pobres - A Nova Gestão da Miséria nos EUA" (Freitas
Bastos Editora, 2001) e "As Duas Faces do Gueto" (sai em setembro pela
Boitempo Editorial). A seguir, os principais trechos da entrevista à Folha:



*Folha - Por que a situação em São Paulo chegou a esse ponto?
Loïc Wacquant - *Porque nas últimas décadas as elites políticas brasileiras
têm usado o estado penal -polícia, tribunais e sistema judiciário- como o
único instrumento não só de controle da criminalidade como de distribuição
de renda e fim da pobreza urbana.
Expandir esse estado não fará nada para acabar com as causas do crime,
especialmente quando o próprio governo não respeita as leis pelas quais deve
zelar: a polícia de São Paulo mata mais que as polícias de todos os países
da Europa juntos, e com uma quase impunidade. Os tribunais agem sabidamente
com preconceito de classe e raça. E o sistema prisional é um "campo de
concentração" dos muito pobres. Como você pode esperar que esse trio
calamitoso ajude a estabelecer a "justiça"?
A manutenção do que chamo de estado penal só faz com que a violência
institucionalizada alimente a violência criminosa e faça com que as pessoas
tenham medo da polícia. Cria um vácuo que o crime organizado sabe muito bem
preencher. Isso permite a eles que cresçam e sejam tão poderosos e ousados a
ponto de desafiar abertamente o Estado e seu monopólio do uso da violência.

*Folha - O sr. acha que os ataques acontecerão de novo?
Wacquant - *Sim, pode-se prever que acontecerão de novo e de novo, pelo
menos enquanto as elites políticas se recusarem a encarar de frente as
desigualdades vertiginosas. Nenhuma sociedade democrática na face da Terra
pode combater o crime apenas com seu aparato policial-judiciário.
Quais os remédios? Os de sempre: educação, emprego, seguro para os
desempregados e uma rede social para os mais pobres. O Brasil paga com
violência criminal sua recusa injustificável de encarar sua desigualdade
social.

*Folha - Uma política de "tolerância zero", a la Rudolph Giuliani quando
prefeito de Nova York, poderia ajudar a resolver o problema?
Wacquant - *Seria um erro duplo. Primeiro porque a queda espetacular do
crime em Nova York não teve nada a ver com a política de "tolerância zero"
de Giuliani, já estava em curso quando o prefeito apareceu na cena e
acontecia em outras cidades norte-americanas e mesmo canadenses, em lugares
que não aplicaram tal política. Segundo porque, no Brasil, aumentar o poder
da polícia equivale a restabelecer a ditadura sobre os pobres e a destruir
ainda mais as bases democráticas do Estado.

*Folha - E a pena de morte?
Wacquant - *Nunca teve efeito definitivo em crimes violentos em nenhum país,
por que haveria de ter no Brasil? Por que bandidos profissionais, que estão
na indústria da violência, temeriam a morte quando eles a vêem diariamente
ao redor deles, quando eles matam e são mortos rotineiramente?

*Folha - O sr. esteve no Brasil algumas vezes. Teve medo?
Wacquant - *Estive sete vezes na última década. Percebi uma mudança
significativa ao longo desse período, com o medo da violência crescendo e se
espalhando. Se as elites não se movimentarem, esse medo jogará o país em um
ciclo vicioso e mortal. O presidente Lula declarou em Viena, no último fim
de semana, que a causa da violência é a falta de programas sociais. Ele está
certo, mas são só palavras. Agora, nós precisamos ver as ações, e elas estão
no campo social, não no campo criminal.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff1505200636.htm
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